O pai que se tornou mãe

Hoje, por ser Dia do Pai, vamos ler o conto "O pai que se tornou mãe".

Foi escrito por José Eduardo Agualusa e faz parte do livro ESTRANHÕES & BIZARROCOS.

         Toda a gente sabe que são as mães que trazem os filhos dentro da barriga. Os bebés formam-se no ventre das mães, crescem, e depois saltam cá para fora - para a luz. Por isso dizemos que as mulheres dão à luz.

O que pouca gente sabe é que há uma excepção. Existe uma espécie animal em que é o pai que cria os filhos dentro da barriga e é ele que os entrega à luz: o cavalo-marinho. Como é que isto aconteceu? É essa a história que hoje vos quero contar: uma incrível história de amor. (…)

Há muito, muito tempo, no tempo em que os Homens ainda não falavam, (…) vivia no mar um casal de cavalos-marinhos. Ele chamava-se Mário, ela Maria. (…) Mário e Maria andavam sempre juntos. O mar, para eles, era um imenso jardim. (…)

Uma manhã Maria acordou doente. Tinha perdido o brilho. Ela que sempre tivera uma cor tão bonita - todo o seu corpo era de um amarelo iluminado - estava a ficar baça e transparente. Sentia-se muito leve, sentia que alguma coisa se apagava lentamente dentro dela. Mário, sempre tão calmo, ficou nervoso. Foi consultar o golfinho, que é um animal inteligente e muito viajado; mas o golfinho nunca tinha visto nada assim. À medida que as horas passavam Maria tornava-se menos existente - desaparecia. Primeiro desapareceu-lhe a cauda, as barbatanas perderam toda a cor, e até a sua voz ficou mais fraca, como se ela estivesse a afastar-se para muito longe.

- Não me deixes- pediu-lhe Mário - Ainda temos tanta coisa a descobrir.

Maria ficou com pena. Não podia deixá-lo tão sozinho. Com as poucas forças que lhe restavam encostou-se a ele.

- Vou dar-te os nossos filhos - disse- quando eles nascerem mostra-lhes o mar.

Disse isto num suspiro e desapareceu. Durante os primeiros dias, sozinho, Mário sentiu-se perdido. O mar deixara de ser um jardim: achava-o agora grande, escuro e perigoso.

E sem  a alegre surpresa de Maria nada lhe parecia realmente novo. Passado algum tempo, porém, notou que o seu corpo se modificava. a barriga crescera, tornara-se firme e redonda, e ele começou a sentir-se outra vez alegre, num estranho alvoroço, embora não soubesse muito bem porquê. Era como se tivesse uma festa a crescer dentro de si.

Então, numa manhã de muito sol, com o mar todo iluminado, Mário viu que a sua barriga se abria, e viu saltarem lá de dentro dezenas de pequeninos cavalos-marinhos. Eram os seus filhos.

Parece-me agora que esta história tem um final feliz. Porque decidi que ela acaba aqui, num nascimento, e porque a partir daquela manhã de sol, passou a existir neste nosso planeta um pai que dá à luz.            

(José Eduardo Agualusa, adaptado)

1. Copia do texto uma frase que mostra que o nascimento dos cavalos-marinhos é diferente do nascimento dos outros animais.

2.  Explica, por palavras tuas, em que é que o nascimento dos cavalos-marinhos é diferente do nascimento dos outros animais?